“Não declaro a minha opinião política porque na moda, e principalmente nos negócios de luxo, é melhor calar a boca”, afirmou Miuccia Prada em entrevista à Vanity Fair. Como quem não pudesse evitar, no entanto, algumas poucas perguntas depois, a italiana já hesitava: “Essa coleção é um símbolo de amor aos rejeitados, às pessoas que enfrentam dificuldades e precisam da nossa atenção”, disse sobre o inverno 2019 da marca.
Essa parece ser uma luta interna sem prazo de validade da designer. Crescendo em meio a viagens pela Inglaterra, França e Irlanda, Miuccia se formou em ciências políticas e passou um bom tempo estudando mímica (sim, mímica!) até ingressar no Partido Comunista Italiano. “Todo jovem vagamente inteligente era esquerdista, então não era como se eu fosse tão especial”, diz ela. O seu interesse político passou a dividir espaço com a moda. Mesmo querendo lutar contra, já que esse, supostamente, não seria o melho lugar para uma feminista dos anos 1960, o chamado se tornou forte demais para ser ignorado.
“No início da minha carreira, ninguém gostava de mim”, relembra a italiana em entrevista ao Document Journal. Evocando provocações cerebrais e muitas vezes com uma boa dose de ironia, Miuccia já foi muito incompreendida. Para os vanguardistas, as suas primeiras coleções não pareciam inovadoras o suficiente e, para os clássicos, havia algo perturbador além da conta. Mas, para ela, a atração da moda está exatamente aí: “Gosto de me mover nesse espaço e nunca agradar a ninguém”.
Miuccia sempre foi essa pessoa. Vinha de uma família burguesa, mas ocupava o campo político de esquerda. Ocupava o campo político de esquerda, mas gostava de moda. Gostava de moda, mas usava roupas da sessão infantil só para não se misturar à multidão. Ao longo da juventude, a contradição foi uma parte fundamental da vida pessoal da italiana e, mais tarde, se tornaria parte do seu trabalho. O feio e o bonito, o velho e o novo, o essencial e o luxuoso: essas são só algumas das discordâncias constantes investigadas em suas coleções.
“A minha vida foi uma completa contradição. Eu sou uma contradição viva. Às vezes, digo ‘vamos promover a complexidade’, porque a Prada não é clara sobre o que é. Você não consegue reduzir a Prada a algo simples. Se a vida não é simples, então porque simplificar uma marca?”, questiona.
Com mais de 40 anos de carreira, a estilista segue sem soluções para muitas de suas crises internas, assim como a maioria de nós. E é aí que está: apesar das suas raras entrevistas ou aparições, Miuccia Prada se mostra humana nas passarelas, expondo em roupas as suas complexidades, camadas e contradições mais íntimas – e, no fim do dia, não é justamente disso que todos nós também somos feitos?